sábado, 4 de abril de 2015

O botão do foda-se

Acredito, do fundo do meu coração, que as pessoas estão enlouquecendo. No mínimo, adoecendo. É cada vez maior a constatação de que as pessoas estão imensamente desconectadas de seu bom senso, do bom e velho simancol. Só hoje, tive duas dessas provas.

Quem leva filho em colégio grande às sete da manhã, sabe o estresse que é. O colégio de minha filha tem uma rampa formando uma meia lua para embarque e desembarque. Após finalmente conseguir entrar na rua da escola, coloquei meu carro na fila de desembarque, que para minha surpresa, não saía do canto. Pois não é que uma criatura dessas que falei acima, louca ou doente, simplesmente ESTACIONOU no meio do percurso? Sim, parou, desceu com seu pimpolho, fechou o carro e entrou no colégio. Simples assim. Apertou literalmente o botão do foda-se. Foda-se quem vier atrás. Minha filha desceu ainda na calçada e foi andando, e tive que aguardar a palhaçada terminar. E assim foi o meu desjejum.

No final do dia, ao voltar do trabalho, precisei passar em uma clínica para agendar minhas sessões de fisioterapia. Havia uma vaga no estacionamento. Estacionei e entrei. Aguardei as secretárias terminarem seus atendimentos e resolvi o que precisava com elas. Mal finalizei o meu atendimento e um senhor já começou a esbravejar com a moça, com a delicadeza de um jumento (que me perdoem os animais). Dei no pé, afinal, estava a fim de ir pra casa descansar. Só que não. Lá estava, um carro atravessado atrás do meu, trancando o estacionamento.

Dando ouvidos ao meu identificador de doido e de doente, parti pra dentro da clínica e fui atrás do digníssimo, que já estava adentrando na cabine para sua sessão. – Senhor, é do senhor aquele carro branco? – Ele simplesmente respondeu: - A senhora vai sair agora? – (Pensei: não, só vim olhar pra essa sua cara de corno!) e respondi um minguado “Sim”. Ele deu meia volta, foi até o seu carro, não me pediu nenhuma desculpinha por ter me trancado, e eu saí, pensando na cara de idiota que eu ficaria caso ele já tivesse iniciado sua sessão e eu não tivesse dado ouvidos ao meu radar. É, A vida tem se tornado mesmo isso: um pandemônio de trânsito, doido, doente, corno, idiota e botões do foda-se. Boa noite.

  

Christian Grey, patelas e a nossa vida alheia


Uma lateralização nas duas patelas – o que antigamente chamávamos de rótulas – me levou a uma clínica de fisioterapia. Inicialmente vinte sessões para ver no que dá. Mas o texto hoje não é exatamente sobre meus joelhos. É sobre o que leva cada um de nós a determinados lugares e a forma como lidamos com isso.

Quem comparece a uma clínica de fisioterapia e passa pela sala de espera entende o que vou dizer. Dá para, ao longo de vinte sessões, por exemplo, escrever um tratado sobre a criação do mundo: A Teoria Cosmológica e seu big bang, a Bíblia e Adão e Eva e tantas outras teses discutidas em mesa de bar, nos templos religiosos e na Academia.

Pois bem, no primeiro dia, desprevenida, não levei nada e fiquei aprendendo como fazer o falso channel, transformando cabelos longos em “curtinhos bob”, morri de ódio lendo que as atrizes magrelas são magrelas porque... bebem água! E me benzi três vezes ao ouvir uma senhora que após confessar só conseguir dormir quando toma rivotril conjugado com outro lá, ensinou a outra mulher como faz para afastar as pretendentes de seu filho (que pela idade da mãe, julgo já ser bem barbadinho).

Segundo dia, lá estava eu e Christian. Aquele mesmo! O GRey! Delícia! Já estou no terceiro livro. Pronto, achei o lugar mais sossegado da face da terra para lê-lo sem ser interrompida. A não ser quando me chamam para iniciar a sessão. Aí começa a segunda parte.

Hoje dividi a sala do tens (aquele choquinho) com uma senhora que me chamou a atenção pela elegância. Em forma, toda cuidada. Sobrancelhas e unhas impecáveis. Choquinho em um dos joelhos e na cervical. Começamos com um papinho tímido pra quebrar o gelo. Daqui a pouco, já estávamos falando sobre os desafios da vida, criação de filhos, etc. Ela, em toda sua tranquilidade natural, me falou que tem dois filhos e que um deles se relaciona há mais de treze anos com uma mulher vinte e três anos mais velha. Obviamente usou a palavra “coroa”.

  O filho hoje tem trinta e três. Mentalmente fiz as contas. E a pergunta que silenciei ela respondeu: “É claro que nunca fui contra e nunca disse absolutamente nada de negativo com sua namorada. Eu sou louca? Quero o meu filho junto de mim! Se eu fosse contra, é lógico que iria perdê-lo. Quero a felicidade dele”.

A sua inteligência me fascinou. Obviamente que aquela situação para uma senhora de seus, não sei ao certo, mas imagino sessenta e poucos anos, não deve ser assim tão simples de digerir. Mas ela teve equilíbrio e inteligência suficientes para no mínimo respeitar. E entender que o que importa é que o filho seja feliz!


Ainda fui para a sala da ultrassom e conversei com outras pessoas. Mas a personagem de hoje muito me ensinou. A voz da sabedoria falando ao vivo e a cores. O verdadeiro amor de mãe. O que pode até não aceitar, mas respeita e deseja, de verdade, a felicidade do filho. E assim é a vida. E assim é o dia a dia nessas clínicas. E ainda me faltam dezesseis sessões!

quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

Cemitério da Recoleta, uma aura de arte e transcedência

Visão externa do Cemitério
      
Assim como Buenos Aires é o destino de muitos brasileiros, o Cemitério da Recoleta é uma das principais atrações turísticas da cidade. Inaugurado em meados do século XIX, e cravado nas praças desenhadas pelo arquiteto e paisagista francês Charles Thays, o cemitério é uma espécie de portal entre a vida espiritual e a mundana. Do lado de fora, em sua rua lateral, ocorrem as noitadas nos cafés, pubs e restaurantes. Lá tanto podem ser degustadas umas boas empanadas como uma pizza no capricho. Sempre regados com a melhor cerveja argentina, claro.



      Além do glamour de guardar os corpos de aristocratas e personalidades influentes na História do país, o cemitério é considerado um museu, pois abriga valiosas obras de arte. Na verdade, trata-se de um labirinto de ruas estreitas e lápides de variadas formas, tamanhos e expressões distribuídos em seus quase seis hectares.



      Uma curiosidade para os mais sangue frio é que é possível ver muitos caixões que ficam expostos em suas lápides de vidro, apoiados em bancos de cimento ou carrinhos de metal. Certamente não é como passear em um museu. A depender da vibração e do perfil de cada visitante.



      A lápide mais concorrida é a de Eva Peron. Após sua morte, em 1953, seu corpo foi embalsamado e exposto por alguns dias para os argentinos. Mas após o golpe de estado, ele foi roubado e ficou desaparecido por anos, até ser encontrado enterrado num cemitério de Milão, na Itália. Quem se encarregou de trazê-lo para sua terra natal foi a Presidente Isabelita Perón, então viúva do ex presidente Perón.

Mausoléu da família de Evita

      O corpo de Evita descansa no Mausoléu da Família Duarte e não deixa de causar uma certa decepção aos desavisados que lá encontram simplicidade estética, diante de tantos outros monumentos fúnebres. Nesse cemitério vá preparado para encontrar de tudo um pouco. Afrodite se deparou com uma equipe coreana gravando um take onde um casal de jovens chega falando algo sobre quem foi Evita e a moça deposita um ramalhete de flores na porta do mausoléu. Cena exigentemente repetida umas nove vezes, até que o diretor se deu por satisfeito e outras pessoas puderam tirar suas fotos e prestar suas homenagens.




      O visitante pode encontrar também, ao cair da tarde, um jovem casal de góticos aparecendo de repente daquelas ruelas. Não importa. Só não deixe de ir, pois se não for levado à reflexão, terá boas imagens na memória e na câmera. E, ao transpor o pórtico de colunas dóricas, deixando para trás o mundo dos mortos, não deixe de tomar uma cerveja no Café La Biela, logo em frente, e celebrar a vida que, nessa cidade, torna-se infinita. 






sábado, 25 de janeiro de 2014

Buenos Aires: destino de muitos brasileiros


      Afrodite inicia 2014 com o pé direito: uma série de matérias sobre Buenos Aires, o destino turístico de muitos brasileiros durante todo o ano. De início, vale ressaltar que a estadia de sete dias valeu por anos de leitura. A cidade respira cultura por onde vamos. Em seus prédios seculares bem conservados vê-se o respeito que a cidade tem por sua História. Lugar cheio de livrarias e de cafés, além de parques sempre frequentados por gente de toda idade, principalmente por jovens.

      Estivemos lá em meado de janeiro. Diga-se de passagem, num verão que não era sentido há quarenta anos! O calor estava de matar! Atmosfera abafada e o ar que se respirava era quente como vapor. Pegamos temperaturas que variaram de 33 a 40 graus, com sensação térmica acima disso. Portanto, nossa recomendação é: se puder ir em outra época, não vá em janeiro. Mas se não tiver como, não deixe de ir, pois ainda assim vale muito a pena!

A dica para o primeiro dia: um tour com o Bus Turístico


      Fazer o passeio com o Bus Turístico no primeiro dia é uma ótima opção. Ele percorre praticamente todos os pontos turísticos que queremos conhecer. Funciona de forma organizada e com 25 paradas onde podemos descer, conhecer o local desejado e pegar os próximos ônibus, que passam a cada vinte minutos.


      Como Buenos Aires é uma cidade que tem muito o que ver, certamente uma estadia não vai ser o suficiente para se curtir com calma cada coisa. Logo, o tour ajuda o visitante a ter uma visão geral e a selecionar o que interessa e descartar o que não lhe pareceu valer a pena.
      O ônibus tem dois andares. O inferior é com ar condicionado, mas dispõe de poucas cadeiras. O de cima é sistema jardineira, tem bem mais cadeiras e é o mais concorrido por conta da vista. Dessas cadeiras podemos fazer boas fotos.

Obelisco, na Avenida 9 de Julho
   
      São disponibilizados aos passageiros fones com as explicações e narrações de fatos históricos à medida que o passeio vai percorrendo os pontos de destaque. Como é uma cidade cosmopolita, o áudio está disponível em diversos idiomas como o Português, o Chinês, o Francês e o Inglês. Só não recomendamos ficar ouvindo muito nos intervalos das explicações, pois toca um só tango o tempo inteiro. Não raro se ouve os passageiros tirando brincadeiras do tipo "não aguento mais esse tango!".

Plaza de Mayo
      Quando compramos o ingresso, ele custava 170 pesos (a cotação estava para cada real, 3,50 pesos). É importante lembrar que a Argentina atualmente passa por um momento delicado e que a inflação tem sido uma constante. Logo, os preços podem ser modificados de um mês para o outro, devendo o viajante fazer uma consulta prévia.

La Bombonera - Estádio do Boca Júnior
      Os bilhetes podem ser comprados com validade de 24 horas ou de 48 horas. Adquirimos bilhetes para 24 horas, mas não é má ideia adquirir para dois dias, pois assim é possível ir para bairros mais distantes, como Caminito, e poder descer e aproveitar melhor cada lugar. Certamente sairá mais barato do que taxi, já que a diferença de preço entre o bilhete de 48 horas é pouca.

Casas construídas com revestimento de navios, na Boca
      Quem quiser seguir viagem non stop em um mesmo ônibus, não tem problema. O percurso tem uma média de três horas e meia, com rápidas paradas em cafés para banheiro e lanche. Para quem fizer essa opção, uma dica é levar na mochila maçãs (as argentinas valem por uma refeição), biscoitos e muita água.

Caminito, principal cartão postal da Boca
            Outra surpresa é quando o ônibus sai do bairro construído pelos operários italianos e segue para Puerto Madero, um bairro construído à margem de diques do Rio da Prata e que desponta com imponentes empreendimentos modernos.

Chegada em Puerto Madero
      O retorno do passeio é feito por Puerto Madero, último bairro do percurso antes de retornar ao circular. Seguem mais fotos tiradas durante o percurso. Maiores informações no próprio site www.buenosairesbus.com









sábado, 11 de janeiro de 2014

Avião, medo e outras neuras afins

Adoro viajar. Aliás, não faço questão de roupa de marca, carro de luxo ou qualquer outro tipo de exigência consumista. Mas viajar é meu fraco. Conhecer lugares, sua arquitetura, história, costumes, culinária, como são as pessoas. Observar outros hábitos abre os horizontes e nos faz enxergar a rotina de forma diferente. Voltamos renovados.

E a viagem inicia bem antes, lá nas pesquisas de passagens, hotéis e roteiros. É uma delícia! Tudo quase um paraíso. Quase. Para mim, particularmente o problema começa com a antecedência de um mês, por volta das três da madrugada. Uma chuva de neuras estraga prazeres insiste em fervilhar na minha criativa cabeça a ponto de me deixar sem sono.

O assunto é básico. Viajamos de carro e ninguém está livre de um acidente. Mas aí, desculpem o mau agouro, podemos sair com algum ossinho quebrado ou alguns hematomas. Já para quem insiste em transgredir a lei da gravidade... Já manjou? O problema é o avião. Sim, esse veículo que nos facilita a vida e que nos põe do outro lado do mundo em muito menos tempo do que permitiria nosso arsenal terrestre ou marítimo.

O interessante é que durante esse período de autoflagelo – um mês antes da viagem – os meios de comunicação insistem em veicular algum tipo de acidente aéreo. É a peste! Tiro e queda! Avião some, avião faz pouso forçado, avião colide, valei-me!

Ontem um piloto de monomotor achou por bem de fazer graça em Nova Zelândia e chamar a atenção da imprensa. Fez pouso forçado numa praia lotada por conta de uma pane. Após consertar o motor e tentar decolar, deu um mergulho tipo golfinho e enfiou o bico nas marolas. E realmente foi cômico porque ninguém teve nada.

Pronto, danou-se! A dois dias da minha viagem, agora esse mote: pane e pouso forçado! Mas não pense que eu não gosto de voar. Acho o máximo um bichão daquele, cheio de gente e de tralha subir e descer todo certinho. Curto todo o processo. Mas curto tensa, dura feito uma vara de bater feijão. O parente que estiver junto de mim na decolagem e na aterrissagem sofre. Passa uns dois dias com o braço todo roxo, porque aperto com força de fazer inveja a Hércules.

A essa altura, deve ter alguém achando que é frescura ou que sou doida. Medo, criatura! Medo. Alguém já lhe falou que é irracional? Sei de todas as probabilidades, que são infinitamente menores do que andar de carro, blá blá blá. Mas vai dizer isso ao meu inconsciente!


Faz parte do meu processo. Talvez algum dia passe. O bom é que nunca deixo de viajar por conta dele. Aliás, ele, o medo de voar, já integra o meu roteiro. É um dos ingredientes para o pico de adrenalina. E quando piso em solo novo, tudo se transforma! O encanto e a curiosidade tomam conta de mim e o espírito desbravador entra em ação. Se o medo fica para trás? Ele se esconde em algum lugar da mala, para entrar em ação na véspera da volta para casa! 


quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

Simone de Beauvoir hoje faria 106 anos, mas ainda é muito atual


      No dia em que o Google homenageou o 106º aniversário de Simone de Beauvoir, a citação não passou despercebida. Muita gente entrou no clima e fez sua menção nas redes sociais. Nascida em 1908, na França, Simone iniciou sua carreira como professora, seguindo como escritora, filósofa existencialista, assim como seu companheiro Jean Paul Sartre, e um dos principais ícones do feminismo no mundo.

      Simone ensinou que não se nasce mulher, torna-se mulher. Chamou para as mães a responsabilidade de repetir os padrões machistas de uma sociedade, ao afirmar que esses valores são repassados por elas juntamente com o leite materno.

      Escreveu ensaios, romances, monografia e até autobiografia. Mas foi com O Segundo Sexo, obra em dois calhamaços, volume I e II, que emplacou suas ideias revolucionárias e filosóficas sobre a condição da mulher, categoria título de seu livro, já que o primeiro sexo, de acordo com os valores da sociedade, no entender da autora, seria o homem.

      A obra foi lançada em 1949 e faz uma abrangente análise sociológica, com riqueza de detalhes históricos e argumentos bem fundamentados, onde desconstrói o biologicismo do feminino e aponta que tudo é uma questão de construção social e histórica. E de decisão.

      À época em que foi escrito, a mulher ainda se encontrava sob o jugo masculino, porém já com fortes indícios de participação ativa como força de trabalho e também na vida intelectual. Apesar de muitos referenciais terem mudado de lá para cá, a leitura ainda é muito atual, pois não é raro filhos e filhas terem tratamentos distintos dentro de um mesmo lar. Como também não é raro ainda se ouvir a frase ”mas ele pode, porque ele é homem”.

      Mulher pegadora ainda é piranha. Homem pegador ainda é garboso. O leite pode ter ficado um pouco mais ralo, mas ainda continua sendo a maior fonte de energia para que toda essa ignorância seja perpetuada. Leitura recomendada, principalmente para as mulheres que desejam ser mães.


domingo, 29 de dezembro de 2013

SIM, EU PRECISO!

“Investigue o motivo que o impele a escrever: Comprove se ele estende as raízes até o ponto mais profundo do seu coração, confesse a si mesmo se morreria caso fosse proibido de escrever. Pergunte a si mesmo, na hora mais silenciosa da madrugada: “Preciso escrever?” Desenterre de si mesmo uma resposta profunda. E, se ela for afirmativa, se for capaz de enfrentar essa pergunta grave com um forte e simples “Preciso”, então construa sua vida de acordo com tal necessidade.” 
Rainer Maria Rilker em Cartas a um jovem poeta.